quinta-feira, 15 de março de 2018

O Medo de Partir

Não era o perfume dela que me excitava, mas sim o cheiro da pele. Não era a cor dos olhos, embora bonitos, mas sim o olhar de uma Capitú esculpida no meio do fogo que me deixava vidrado... Às vezes aquele olhar me dava medo. Não o tipo de medo de se assustar mas sim o medo de se impressionar...
A pele dela parecia da cor de papel quando mergulhado no café e eu me lembro bem que seus cabelos tinham um toque de cortado em casa. A franja engraçada balançava quando ela piscava e ria. Eu adorava quando a franja dela balançava.
Era pão e manteiga e suco caso desse sede de beber. A gente não passava fome na hora de se morder e nem passava sede na hora de se beijar. Um deitava em cima ou do lado do outro pra sentir o corpo de um sob o corpo do outro, o corpo de um do lado do outro, na hora em que queríamos nos conectar.
A minha respiração era lenta e calma, enquanto a dela, rápida e forte. Era bonito de se notar que às vezes meu ar sincronizava com o dela, ou o dela se acalmava junto ao meu. Às vezes eu acordava de madrugada e depois de eu estar alguns minutos na cozinha ela acordava e me gritava do quarto com uma voz de desespero, quase igual ao de uma criança perdida.
Eu ia até ela e perguntava o que tinha acontecido, e ela sempre falava "eu fiquei com medo que você tivesse ido embora". E eu sempre achava isso interessante... Ela tinha medo de que eu partisse, assim, do nada. Sem mais nem menos. Como uma folha seca no outono que uma hora devido ao vento forte tá no fundo do quintal e na outra, em um bueiro molhado.
Ela sempre teve medo que eu fosse embora. Acho engraçado que ela sempre teve tanto medo de que eu partisse... Quando no fim foi ela quem decidiu ir.

O.A.

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